sexta-feira, setembro 16, 2005

In the beginning there was Scratching

Como diria Margarida Rebelo Pinto, não há coincidências. Em 1979, ano em que morria Sid Vicious, Joe e Sylvia Robinson, dois experientes produtores discográficos, resolveram fundar a Sugar Hill Records. Perguntar-me-ão o que é que uma coisa tem a ver com a outra. E eu responderei: aparentemente, nada.

A História – a que interessa – começou no Verão seguinte, quando Sylvia, ao parar numa pizzaria de Englewood, NJ, escutou as palavras debitadas por um tal de Henry Jackson e, encantada com aquilo que ouviu, decidiu fazer um disco de rap. Para tal, a antiga cantora soul/funk, reuniu o dito Jackson – entretanto rebaptizado de Big Bank Hank – com Wonder Mike e Master Gee. Os três formaram o Sugarhill Gang que, sobre a linha de baixo do clássico disco dos Chic – Good Times –, criou aquela que é muito justamente considerada a opus 1 do hip-hop.

“I said a hip hop, the hippie, the hippie to the hip hip hop, a you don’t stop (…)”, é com estas palavras fundadoras e proféticas que Rapper’s Delight abre. O single, cuja versão original ultrapassa os 14 minutos, vendeu para lá de dois milhões de exemplares à volta do mundo e moldou o estilo daquela que viria a ser chamada de Old School.

Quando se ouve falar na Sugar Hill Records, pensa-se automaticamente em hip-hop, em breakdance e numa retoma da consciência social por parte da população negra das grandes cidades americanas. E pensa-se muito bem. A editora, graças ao estrondoso êxito de Rapper’s Delight, acabou por ser a primeira e principal rampa de lançamento deste estilo que tanto e tão bem marcou a música pop na viragem da década de setenta para os anos 80 de Reagan. Um rap cru, para ser tocado, ouvido e dançado nas ruas. Um rap onde o scratching é preponderante, ou não tivesse sido o gira-discos o seu primeiro instrumento. Um rap que, de forma velada, sob um groove carregado de boa disposição, começou a introduzir referências à severidade da vida no gueto e ao desagrado dos que lá têm de viver, o qual, anos depois, com os Public Enemy, ganharia contornos de revolta.

Até meados dos anos 80, a Sugar Hill foi editando regularmente e marcando a agenda rap. Ao Rapper’s Delight dos Sugarhill Gang (que apesar do sucesso cedo se eclipsaram), seguiram-se outros temas, quase sempre em edições de 12 polegadas, hoje clássicos indiscutíveis: Monter Jam (1980) de Spoonie Gee; Suspicious Minds (1981) de Candi Stanton; Breakdance/Electric Boogie (1982) dos West Street Mob; e sobretudo The Message (1982) e White Lines (1983) de Grandmaster Flash, com ou sem The Furious Five. Porém, a meio da década, começaram a surgir problemas financeiros decorrentes da saída dos seus principais artistas, ao mesmo tempo que uma nova escola, liderada pelos Run DMC, emergia e dava início à chamada Golden Age. Em 1986, a Sugar Hill fechou portas. Mas o hip-hop – quiçá a mais importante revolução na pop desde o encontro entre Malcolm McLaren e Sid Vicious – tinha vindo para durar. ENP

(publicado no suplemento SARL do Jornal dos Açores)

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

SOS musical:
Agradece-se ajuda na identificação de um delicioso tema, de tom revivalista a fazer lembrar os "covers" de Mick Harvey (e a voz também), cantado em dueto (voz masculina e voz feminina), a rodar actualmente com frequência na rádio radar.

10:48 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

“Há 30 anos, numa hora de aperto, alguns militares fizeram um Golpe de Estado e melhoraram a carreira: um tornou-se terrorista, assaltou bancos e safou-se da prisão à conta do Presidente amigo; outros abriram empresas em Angola e participaram no saque, sendo agora burgueses ricos e gordos; outros fizeram tudo para apagar o rasto de assassinos e foram para a extrema esquerda defender os trabalhadores; os restantes desapareceram no meio da multidão” – Quitéria Barbuda in “O Eterno retorno”, Revista “Espírito”, nº 19, 2005.

www.riapa.pt.to

9:53 da manhã  

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