quarta-feira, agosto 10, 2005

Da Escócia com amor


Houve um tempo em que os singles eram reis e senhores. Acontece que os tempos mudam, pelo que esse já lá vai. Ainda assim, cada década tem uns quantos resistentes do formato. Os oitenta tiveram nos The Smiths a banda de singles por excelência (na verdade, a banda por excelência, tout court). No caso, os álbuns serviam apenas para juntar o que havia sido editado nos meses anteriores e tornar mais fácil a vida do consumidor. Os Belle and Sebastian – que cumprem com grande dignidade o trabalhinho de apanhar o que resta dos anos oitenta e, em particular, a herança smithoniana – têm, desde sempre, esse hábito em desuso de lançar singles, ou E.P.’s se preferirmos.
A opção é legítima, não fora dar-se o caso de dificultar a vida ao fã mais ambicioso, que tudo quer conhecer e comprar. Contudo, nunca é tarde para corrigir o erro. Foi isso que a banda agora fez. Depois de um disquito assim para o sofrível, resolveram juntar os E.P.’s perdidos, lançados pela sua editora mãe (Jeepster), e deram à luz, “Push barman to open old wounds”. O disco vem embalado em termos, com um booklet como deve de ser e junta 25 músicas. E aí começam os problemas. Os primeiros temas são de 1997 e os últimos, mais recentes, de 2001. A questão é simples: os Belle and Sebastian fizeram coisas superlativas em 1997 e coisas assim para o sofrível em 2001. A razão desconheço-a. Mas do iniciático “The state that I am in” (quem resistir a cantar esta canção padece de um mal de espírito qualquer) até às últimas músicas vai uma distância do tamanho da sua Escócia natal.
E pergunta o leitor: em que é que isto diminui o disco em apreço? A resposta é de uma limpidez cristalina, em rigorosamente nada. Os Belle and Sebastian são uma banda de que ou se gosta ou não se gosta. Não há espaço para a indiferença e esta compilação serve para se gostar ainda mais dos rapazes de Glasgow. A música é, como quase sempre, feita de um boculismo verdejante e de um lirismo exacerbado. Melodias trauteáveis, vozes efeminadas a contar-nos as suas “shelf lifes”. 25 músicas depois, não deixa, contudo, de espantar que, para além de três primeiros discos perfeitos (Tigermilk; If you’re feeling sinister e The boy with the Arab strap), ainda houvesse tudo isto para ser ouvido. Ouçam e vão ver que, na última década, não foi inventada banda sonora melhor para nos apaixonarmos. Um prazer rídiculo, é verdade, mas não irrelevante, há que convir. PAS
publicado no suplemento SARL do Jornal dos Açores

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

"Fold your hands, child, you walk like a peasant" e "Storytelling" (bso) são relativamente sofríveis.
Já o que está para trás é, em boa verdade, objecto de culto.
Quem se lembre, que tente cantar "Oh, get me away from here I´m dying", "Kerouac´s beckoning with open arms and open fields of eucaliptus" e "I´m not as good as Dostoievsky, I´m not as tender as Mark Twain". Conseguiram? Se sim, não se sentem revigorados?

12:10 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Está bem, "Dear Ctastrophe Waitress" também vai para a categoria dos sofriveis.

Errata:
1) Na letra de "This is just a modern rock song", lê-se "I'm not as sad as Doestoevsky,I'm not as clever as Mark Twain", mas o que o Stuart Murdoch canta é "I´m not as good as Doestoevsky, I´m not as clever as Mark Twain".
2) Na letra de "Le Pastie de la Bourgeoisie", lê-se "Kerouac's beckoning with open arms
and open roads of eucalyptus", mas o que o Stuart canta é "Kerouac's beckoning with open arms
and open filds of eucalyptus".

12:17 da tarde  

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